NEC = Nota do Editor Chefão: texto inédito.
Aurora Gorda – O jornalista, ex-bancário, conta suas relações com a lendária Aurora Resende, empresária da noite.
Don Oleari que me aguente! A culpa é dele, ao aceitar que eu voltasse a escrever neste espaço, porque vez por outra trarei de volta alguns fatos da minha vida pessoal e profissional que estavam meio adormecidos.
O de hoje, por exemplo. Falo da “empresária” Aurora Resende, nascida com esse nome de família tradicional (algumas más línguas diziam ser ela prima de um dos políticos mais conceituados deste Estado (*).
(*) A crônica de Vitória dá como certa a versão de que Aurora Gorda era prima do ex-governador Eurico Resende.
Aurora
Vim transferido do banco em que trabalhava, de Aimorés para Vitória, com a condição de ser caixa, como lá. Ao assumir o cargo foram logo me prevenindo: nós temos aqui uma “empresária” que é uma das maiores depositantes do banco, tratada com grande gentileza por todos, do contínuo ao gerente, e tem suas próprias “normas” não podendo ser contrariada por ninguém, para evitar que ela encerrasse sua conta…
Foto: http://www.ijsn.es.gov.br/bibliotecaonline/Record/11422
Eram dois caixas: um, o recebedor, função que assumi; o outro, o pagador, função de antigo e experiente funcionário de carreira. Seu nome era Aminthas Ramos, um dos maiores e mais fiéis amigos que tive.
Ela chegava no banco em cima da hora de encerrar o expediente. O motorista particular, dirigindo o carrão dela, importado, estacionava o veículo em frente à porta principal do banco, saltava, abria-lhe a porta, e ela, como uma “lady”, se dirigia ao caixa recebedor, punha na sua frente um pacotaço de dinheiro dizendo o valor.
Ele, o caixa, tinha que acreditar: passava-lhe o recibo imediatamente. Ela não esperava, em hipótese alguma, e nenhum funcionário era tolo de contrariá-la. Entrava no carro e voltava para sua “empresa”.
Ao descobrir que o dinheiro estava incompleto, fui à “empresa” dela reclamar porque não tinha no pacote o valor que ela disse que tinha.
Chegando ao “escritório” de de Dona Aurora, fui atendido por uma das “secretárias” e dizendo logo que precisava falar com ela.
Ela própria ouviu lá de seu “gabinete” e perguntou quem queria falar com ela e eu respondi, de pernas bambas e voz trêmula: é o Alencar, caixa do Banco Hipotecário.
Ela, prontamente, berrou de lá: – “pode deixar entrar”.
Meio perdidão e apavorado, gritei e me postei de frente pra ela (Era um calor infernal, e Don Aurora, bem gorda, cercada de dois possantes ventiladores…):
– Eu contei o dinheiro todinho e constatei que faltava a terça parte do valor declarado na boca do caixa.
Dona Aurora berrou de novo:
– Menina vem cá, o que você arranjou? Vê lá se não ficou algum pacote de dinheiro pra trás?
A secretária voltou e disse que realmente ficou um pacote para trás. Ela, brava:
– Traz o dinheiro para o menino .
Eu tinha, na época, uns 25 anos, no máximo. Saí de lá quicando de felicidade, porque se ela não assumisse a responsabilidade pelo que faltava, eu teria que pagar um valor que representaria meu salário e gratificações de mais de um ano de trabalho.
De volta ao banco, fui recebido festivamente pelos mais de 40 colegas que me esperavam. Eles não perderam a oportunidade de gozar com a minha cara, dizendo:
– Esse mineirinho só tem cara de bobo; querendo “comer” de graça, bateu na porta de Aurora com essa invenção.
O presente registro é uma homenagem à memória dessa “empresária”, por ela ter demonstrado ser uma pessoa honesta.