NEC = Nota do Editor Chefã0:
Hamilton Gangana é uma celebridade da publicitade de Belzonte, Minas Gerais. Amigo do nosso querido parceiro Rubens Pontes e por isso mesmo, Gangana veizincando mando belos relatos para o Portal Don Oleari.
Vejam que delícia a historinha com o célebre Silvio Caldas, anunciado para um programa de despedida da TV Itacolomi, da qual ele e Rubens Pontes foram diretores. Pontes apresenta Gangana logo aí, ó! (Oswaldo Oleari Oleare).
Pescaria em Três Marias/MG
Interessante e pitoresco registro de uma fase romântica da história que nos mata de saudades.
Silvio Caldas era exatamente assim como registra Hamilton Gangana. Certa vez, deixou de cumprir contrato para se apresentar numa boite em Belo Horizonte/MG para nos acompanhar numa pescaria em Três Marias.(Rubens Pontes).
Hamilton Gangana
Durante vários dias, a TV Itacolomi anunciou um programa de despedida de Sílvio Caldas, o “caboclinho querido” do Brasil, patrocinado pela Phillips e pela Ingleza- Levy.
O cantor não apareceu.
Quinze dias depois, novas chamadas no ar: o “maior seresteiro do Brasil”- Sílvio Caldas – estará em Belo Horizonte, cumprindo o contrato assinado.
O homem deu o bolo de novo.
Centenas de telespectadores indignados criticaram a “irresponsabilidade da emissora”, ao prometer e não cumprir, inconsoláveis por não poderem ver o cantor pela última vez: Sílvio Caldas (1908/1998) estava “se despedindo dos palcos”, encerrando a carreira! E era mentira.
Terceira tentativa, para o “tudo ou nada”! Chamadas no ar e muitas gozações também. Fui escalado pela Starlight Propaganda (de Orlando Junqueira e Huascar Terra do Valle) para ir ao Hotel Ambassy receber, confirmar presença e acertar detalhes da já conturbada apresentação.
Na recepção um aviso:
– O senhor Sílvio Caldas está descansando, não receberá ninguém!
Durante cerca de duas horas, fiquei aguardando. Liberado, subi e disse o motivo da visita. Saído do banho, enrolado numa toalha, SC foi enfático:
– ”Sou Sílvio Caldas, o maior cantor brasileiro. Adoro esta terra, gosto muito da gente mineira, desse jeito meio caipira de falar, das comidinhas e das mulheres. Sou amigo de JK, que me deu de presente esse violão aí, com a dedicatória gravada na chapinha de ouro: “Ao seresteiro do Brasil, a homenagem de JK”. E meu patrocinador, aqui, quem será? – Ah!…Esse Levy aí deve ser um judeu, filho da mãe, mala cheia do dinheiro!… Judeu não brinca. Muito bem!
Já de calça de linho branco, camisa cor de rosa e perfumado, Sílvio me diz:
– Estou cansado de comida de hotel e de avião, quero comer uma comidinha mineira, pode me indicar?”
Já perto das 4 da tarde, fomos caminhando ao restaurante Rosário, na avenida Paraná. Demos uma baita sorte, pois encontramos o compositor Rômulo Paes, que quase teve um troço.
– “Meu Deus do céu, isso é uma visão. Sílvio Caldas? Não acredito!”.
Comuniquei à agência que o homem estava bem, almoçando no Rosário. Disseram-me que o Gerson Caetano da Itacolomi já havia ligado ene vezes, e queria saber como deveria ser o cenário; a direção da emissora cobrava, insistentemente, imaginando um terceiro bolo e ainda mais, àquela hora, sem ter a menor condição de dar uma satisfação ao telespectador, com a atração sendo anunciada.
Chega Henrique de Almeida, compositor, então radicado em BH e o papo com as comidinhas, cachaça, whisky e gente ao redor, só aumentando.
Pedi licença a Sílvio Caldas e disse a ele, com muito jeito, que a TV estava preocupadíssima, cobrava informações urgentes, tinha que montar o programa, tudo estava atrasadíssimo, os telefones tocando e já passava das 6 horas!
– Menino, sou o Sílvio Caldas. Não preciso de nada. Só de um cenário de favela, com luz de fundo. Um banco comum, simples. O resto é comigo. Ah! Não esqueçam do meu prefixo: Lá lá, lá, rá, rá, ri, lá, lá, la rá, lá ri…Sabe qual é, né? (Dorme, fecha esse olhar…”Serenata”-1934).
Na chegada à TV, a entrada do edifício Acaiaca estava repleta de fãs, muitos com LP nas mãos, para dedicatória. Silvio Caldas abriu o programa cantando seis números seguidos, sem dar uma palavra sequer.
Fez isso mais duas vezes e só conversou com o telespectador ao final, agradecendo.
Foi um sucesso e um alívio. Amigos formaram um grupo de choque e o conduziram para a Gruta Metrópole, onde estava concentrada a turma de seresteiros (etílicos) profissionais: Camilo Teixeira da Costa, Wilson Frade, Rômulo Paes, Cyro Siqueira, José Bento, Henrique de Almeida, Gervásio Horta, entre outros, e o conhecido advogado Delfino Santa Rosa, boêmio, intérprete-amador, com profundo conhecimento do repertório e da história de Sílvio Caldas – mostrou a matéria, dia seguinte, no jornal ESTADO DE MINAS.
Fim de noite, missão cumprida, peguei um coletivo Pompeia e fui para casa descansar e me preparar para o dia seguinte, após uma tarefa complexa, mas histórica.
O ano? 1965, com a ditadura militar a pleno vapor, sob o comando do frio Marechal Humberto Castelo Branco.
Hamilton Gangana, publicitário,
jornalista, radialista
Corrida tem papel fundamental na saúde mental durante pandemia
“Serensta” – Silvio Caldas –