Marilia de Dirceu
Coluna AQUI RUBENS PONTES
MEUS POEMAS DE SÁBADO
O Portal Don Oleari, em registo anterior en passant, citou a obra “Marilia de Dirceu”, de Tomás Antônio Gonzaga, como o primeiro livro impresso no Brasil, em 1792, ano da fundação da Imprensa Régia pelo Imperador.
Naquela época, era o Imperador quem decidia que livros seriam publicados. Com impressão fora das oficinas reais proibida, só era divulgado o que não ofendia o Estado, a religião e os costumes.
A obra de Tomaz Antônio Gonzaga foi editada antes da deflagração do movimento de insurreição, à época o autor, português de nascimento, era um magistrado muito prestigiado pela Coroa portuguesa.
Nota do Portal Do Oleari
“A Gazeta”, no Rio de janeiro, foi o primeiro jornal impresso no Brasil depois da revogação da proibição de imprimir livros)
O poeta
Tomás Antônio Gonzaga nasceu em 11 de agosto de 1744, em Miragaia, cidade do Porto, Portugal. O pai, João Bernardo Gonzaga, brasileiro nascido no Rio de Janeiro, e a mãe, Tomásia Isabel Clark, portuguesa.
Em 1752, o escritor se mudou para o Brasil com seu pai nomeado ouvidor-geral de Pernambuco, e passou a estudar no colégio de jesuítas, na Bahia.
Nove anos depois, em 1761, regressou a Portugal para estudar na Universidade de Coimbra, onde cursou Leis, recebendo o título de bacharel em 1768, nomeado Juiz de Fora em 1779, na cidade de Beja, em Portugal.
Três anos mais tarde, nomeado Ouvidor Geral, mudou-se para Vila Rica, no Brasil.
Foi na futura Ouro Preto que, em 1786, conheceu e se apaixonou pela jovem Maria Doroteia Joaquina de Seixas Brandão, a sua Marília de Dirceu.
Anos depois, em 1786, apesar de ser nomeado desembargador na Bahia, Tomás Antônio Gonzaga continuou a viver em Vila Rica, onde, no ano seguinte, ficou noivo de Maria Doroteia.
Foi a época em que eclodiu em Vila Rica a Inconfidência Mineira, e em 1789, acusado de conspiração, foi preso na ilha das Cobras, no Rio de Janeiro.
O julgamento ocorreu três anos depois, em 1792. Condenado, o poeta foi degredado e passou o resto de sua vida em Moçambique, na África.
Poeta, mas não bobo, casou-se com a rica Juliana de Sousa Mascarenhas, com quem teve dois filhos. Em 1806, tornou-se procurador da Coroa e da Fazenda de Moçambique e três anos depois, juiz da alfândega.
Mais poeta do que revolucionário, Tomás Antônio Gonzaga faleceu em fevereiro de 1810, naquele país africano.
O inconfidente não deixou sua marca como herói, mas o poeta se imortalizou com sua obra.
O colunista se irmana na lembrança do movimento dos inconfidentes mineiros – ponto de inspiração para a independência brasileira – publicando trechos do seu mais inspirador poema.
https://brasilescola.uol.com.br/literatura/tomas-antonio-gonzaga.htm
O que poderia causar perplexidade é a publicação de um livro, assinada por um membro da Inconfidência mineira, mas, à época da edição, em 1792, Tomaz Antônio Gonzaga era um magistrado com alto prestígio junto à Coroa Portuguesa, português por nascimento, filho de pai brasileiro e mãe portuguesa.
Foi jurista, ativista político, poeta, iniciou seus estudos em Portugal e os completou no Brasil. Mais tarde, em Vila Rica, a atual Ouro Preto, participaria da Inconfidência Mineira e se apaixonaria, aos 4o anos de idade, pela jovem Maria Joaquina Dorotéia Seixas, de 16 anos.
Marilia de Dirceu
Dois anos mais tarde ficaram noivos, mas o casamento não se realizou, pois o noivado foi cancelado em virtude da prisão de Tomás Antônio Gonzaga, então envolvido no movimento da Inconfidência Mineira e condenado ao exílio em Moçambique.
Maria Doroteia, o pai Capitão Balthazar, a irmã Emerenciana e pelo menos uma de suas tias, pelo lado materno, Dª Catarina, eram da Ordem Terceira de São Francisco de Assis de Ouro Preto (foto), que reunia o círculo das famílias mais tradicionais da colônia.
A Coluna selecionou trechos do longo poema “Marília de Dirceu”, sua obra-prima, longo poema lírico dividido em três partes.
Rubens Pontes, jornalista
Capim Branco, MG
MARÍLIA DE DIRCEU
(trechos)
Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
que viva de guardar alheio gado,
de tosco trato, de expressões grosseiro,
dos frios gelos e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal e nele assisto;
dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
das brancas ovelhinhas tiro o leite
e mais as finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela,
graças à minha Estrela!
Eu vi o meu semblante numa fonte;
dos anos inda não está cortado
os pastores que habitam este monte
respeitam o poder do meu cajado.
Com tal destreza toco a sanfoninha,
que inveja até me tem o próprio Alceste:
ao som dela concerto a voz celeste,
nem canto letra que não seja minha.
Graças, Marília bela,
Graças `minha Estrela!
Mas tendo tantos dotes da ventura,
só apreço lhes dou, gentil pastora,
depois que o teu afeto me segura
que queres do que tenho ser senhora.
É bom, minha Marília, é bom ser dono
de um rebanho, que cubra monte e prado;
porém, gentil pastora, o teu agrado
vale mais que um rebanho e mais que um trono.
Graças, Marília bela,
graças à minha Estrela!
Os teus olhos espalham luz divina,
a quem a luz do sol em vão se atreve;
papoila ou rosa delicada e fina
te cobre as faces, que são cor da neve,
Os teus cabelos são uns fios d’ouro;
teu lindo corpo bálsamos vapora.
Ah! não, não fez o céu, gentil pastora,
para a glória de amor igual tesouro!
Graças, Marília bela,
graças à minha Estrela!
Leve-me a sementeira muito embora
o rio, sobre os campos levantado;
acabe, acabe, a peste matadora,
sem deixar uma rês, o nédio gado.
Já destes bens, Marília, não preciso
nem me cega a paixão, que o mundo arrasta;
para viver feliz, Marília basta
que os olhos movas, e me dês um riso.
Graças, Marília bela,
graças à minha Estrela!
Irás a divertir-te na floresta,
sustentada, Marília, no meu braço;
aqui descansarei a quente sesta,
dormindo um leve sono em teu regaço;
enquanto a luta jogam os pastores,
e emparelhados correm nas campinas,
toucarei teus cabelos de boninas,
nos troncos gravarei os teus louvores.
Graças, Marília bela,
graças à minha Estrela!
Depois que nos ferir a mão da Morte,
ou seja neste monte, ou noutra serra,
nossos corpos terão a sorte
de consumir os dous a mesma terra.
Na campa, rodeada de ciprestes,
lerão estas palavras os pastores:
“Quem quiser ser feliz nos seus amores,
siga os exemplos que nos deram estes”.
Graças, Marília bela,
graças à minha Estrela!
Tu não verás, Marília, cem cativos
tirarem o cascalho e a rica terra,
ou dos cercos dos rios caudalosos,
ou da minha serra.
Não verás separar ao hábil negro
do pesado esmeril a grossa areia,
e já brilharem os granetes de oiro
no fundo da bateia.
Não verás derrubar os virgens matos,
queimar as capoeiras inda novas,
servir de adubo à terra a fértil cinza,
lançar os grãos nas covas.
Não verás enrolar negros pacotes
das secas folhas do cheiroso fumo;
nem espremer entre as dentadas rodas
da doce cana o sumo
Verás em cima da espaçosa mesa
altos volumes de enredados feitos;
ver-me-ás folhear os grandes livros,
e decidir os pleitos
Enquanto revolver os meus consultos,
tu farás gostosa companhia,
lendo os fastos da sábia, mestra História,
e os cantos da Poesia
Lerás em alta voz, a imagem bela;
eu, vendo que lhe dás o justo apreço,
gostoso tornarei a ler de novo
o cansado processo.
Se encontrares louvada uma beleza,
Marília, não lhe invejes a ventura,
que tens quem leve à mais remota idade
a tua formosura.
Marilia de Dirceu
Flavia Miranda Oleare: pais de redes sociais | 10/11
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Marilia de Dirceu
Marilia de Dirceu
Marilia de Dirceu