Patativa do Assaré
COLUNA AQUI RUBENS PONTES:
Meus poemas de sábado
Em ritmo de eleições:
“As formiga a defendê
Sua casa, o formiguêro
Botando o boi pra corrê
Da sombra do juazêro.
Mostraro nessa lição
Quanto pode união;
Neste meu poema novo
O boi zebu qué dizê
Que é os mandão do podê
E as formiga é o povo.
Patativa do Assaré – in “O boi e as formiga”
Dois fascinantes expoentes da cultura popular, os repentistas e os cordelistas possuem características próprias e surpreendentes como, por exemplo, a não exigência sequer de escolaridade, muito menos cultura literária, para exercitar seu talento nato.
O Cordel é escrito com rimas e publicado em folhas de papel, e o Repente é falado e improvisado, podendo ou não ser acompanhado por instrumentos musicais.
O Portal Don Oleari e o Colunista concordam com o crítico Orlando Tejo (livro Zé Limeira, Poeta do Absurdo), quando ele conceitua os Cantadores como “imensa legião de homens que amam, sonham, sofrem e brincam de viver no mundo pescando estrelas, caçando ilusões, plantando tardes, colhendo auroras, levando sua imagem útil e profunda, tímida e vigorosa ao povo ávido de poesia que os ouve embevecido.”
Manoel Bandeira, nosso poeta maior, confessa-se humilde diante do cantador e registra em uma de suas obras … “que poeta é quem inventa em boa improvisação… como faz qualquer violeiro, cantador do Sertão”.
Trovadores
Esse tipo de manifestação poética é predominante nos sertões nordestinos, mas também ocorre em outras regiões do País, até no Rio Grande do Sul, onde os repentistas são chamados de trovadores.
Um deles, o poeta repentista gaúcho Xiru do Sul, mora na cidade da Serra, ES. O Espírito Santo abriga outro renomado repentista nordestino, Pedro Maciel da Silva, o Ceará, operário numa empresa de construção, a “Procalco”, que veio em 1971 trabalhar como pintor de casas no bairro de Eurico Salles e André Carloni.
Em 1980 trouxe a família, passando a morar no Bairro São Diogo. Sócio do Clube dos Trovadores Capixabas, é o único Poeta Repentista Cantador de Viola da Grande Vitória, tendo representado a Assembleia Legislativa do ES em várias solenidades.
Os Poetas Cordelistas ocupam bom espaço no campo da poesia no Espírito Santo. São destaques além fronteira nomes como os de Kátia Maria Bobbio Lima (Conceição da Barra), Moacir Malacarne (Cariacica), e Juacy Lino Feu (Serra).
Aqui Rubens Pontes: meu poema de sábado | Renato Pacheco, de Kátia Bobbio | 10/7
https://donoleari.com.br/poema-de-sabado-renato-pacheco-de-katia-bobbio/
Cordelistas
– Os cordelistas relatam seus poemas em seus versos de sete sílabas rimadas, divididas em estrofes. O nome Cordel vem de barbante, onde os nordestinos penduravam seus livretos, nas praças das cidades.
O Colunista se deteve em um nome de repentista e principalmente cordelista sobre o qual a visão dá a unanimidade dos críticos brasileiros é de admiração e respeito: – Antônio Gonçalves da Silva (1909-2002), membro de uma família de modestos agricultores de subsistência em Assaré, Ceará.
Ainda na infância contraiu sarampo e ficou cego do olho direito. Com a morte do pai, aos 8 anos, passou a trabalhar no eito, levado a abandonar a escola local onde, sem ser devidamente alfabetizado, ficou por apenas alguns meses.
E assim, sem mais nem menos, começou a fazer repentes e a se apresentar em festas locais. Aos 20 anos recebeu o pseudônimo de Patativa – comparável à beleza do canto da ave. Ao passar do tempo, ganhou popularidade nacional, sucessivamente laureado , cinco vezes recebendo títulos de Doutor Honoris Causa,
Ainda assim, “Patativa do Assaré” jamais deixou a região onde foi criado, no sertão cearense. Aos 93 anos de idade, com sua impressionante memória, recitava de cor qualquer um de suas centenas de poemas que lhe fosse solicitado em seus saraus.
O grande poeta brasileiro, nascido em 5 de março de 1909, em Assaré, faleceu na mesma cidade em 8 de julho de 2002.
Rubens Pontes, jornalista.
Publicamos duas criações de Patativa do Assaré, pertinentes com nosso momento eleitoral, lá e cá.
O QUE MAIS DÓI e O PEIXE.
O que mais dói
Patativa do Assaré
O que mais dói não é sofrer saudade
Do amor querido que se encontra ausente
Nem a lembrança que o coração sente
Dos belos sonhos da primeira idade.
Não é também a dura crueldade
Do falso amigo, quando engana a gente,
Nem os martírios de uma dor latente,
Quando a moléstia o nosso corpo invade.
O que mais dói e o peito nos oprime,
E nos revolta mais que o próprio crime,
Não é perder da posição um grau.
É ver os votos de um país inteiro,
Desde o praciano ao camponês roceiro,
Pra eleger um presidente mau.”
O Peixe
Patativa do Assaré
Tendo por berço o lago cristalino,
Folga o peixe, a nadar todo inocente,
Medo ou receio do porvir não sente,
Pois vive incauto do fatal destino.
Se na ponta de um fio longo e fino
A isca avista, ferra-a inconsciente,
Ficando o pobre peixe de repente,
Preso ao anzol do pescador ladino.
O camponês, também, do nosso Estado,
Ante a campanha eleitoral, coitado!
Daquele peixe tem a mesma sorte.
Antes do pleito, festa, riso e gosto,
Depois do pleito, imposto e mais imposto.
Pobre matuto do sertão do Norte!
Rubens Pontes, jornalista
Capim Branco, MG
Principais obras de Patativa do Assaré
– Inspiração Nordestina – 1956
– Inspiração Nordestina: Cantos do Patativa –1967
– Cante Lá que Eu Canto Cá – 1978
– Ispinho e Fulô – 1988
– Balceiro. Patativa e Outros Poetas de Assaré – 1991
– Cordéis – 1993
– Aqui Tem Coisa – 1994
– Biblioteca de Cordel: Patativa do Assaré – 2000
– Balceiro 2. Patativa e Outros Poetas de Assaré – 2001
– Ao pé da mesa – 2001
Patativa do Assaré
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