Farinha, pirão
Coluna CONTRAPONTO – Eustáquio Palhares
Nada desconstrói ou desmoraliza mais uma ideia do que sua péssima execução. Nenhuma boa ideia resiste ao insucesso de sua implementação. Efeito parecido ocorre com palavras e termos que embutem conceitos, ideias e propostas poderosas mas que pela banalização se desmoralizam, a trivialidade os reduzindo a arremedos do que originalmente expressam.
Assim, aviltou-se o termo “pacto social”, talvez a grande solução para aplainar as assimetrias da nossa sociedade instituídas no processo de (de)formação social e consolidadas pelas elites que se revezaram controlando as instâncias que governam essa sociedade. Um pacto traduz um consenso, um acordo explícito de partes que embora antagônicas se unem no enfrentamento de um desafio comum.
A expressão, não apenas foi depreciada por chistes e piadinhas que remetiam aos conflitos de classe, menosprezando a conciliação que o termo propõe, como foi considerada um devaneio utópico, romântico e inviabilizado pela tensão do conflito das tantas partes da coletividade.
A sociedade brasileira está retalhada pelo corporativismo, funcionando com segmentos estanqueizados que entendem que seus privilégios são justos e incontestáveis, que suas necessidades são maiores que a do restante e provê-las,mesmo a custo dos outros é direito legítimo e inatacável.
Pirão
Isso envolve tanto os que vivem no setor público, políticos, funcionários públicos, membros do Judiciário com suas remunerações que conflitam com o ganho médio do brasileiro, além de regalias que distinguem algumas categorias, somando-se férias em dobro e recessos sazonais, até 80 dias anuais de ociosidade e descanso.
Estende-se também às classes, quaisquer que sejam e que não passam de parte de um todo cuja percepção se perde porque no clima de salve-se quem puder importa resguardar seus interesses prioritariamente.
A soma das partes não pode exceder ao todo. É uma impossibilidade física. Os direitos que assistem à população de funcionários públicos contrastam constrangedoramente com o que se reserva à população de trabalhadores da iniciativa privada. Desde a discutível estabilidade – patrocinadora da improdutividade pública – jornadas de trabalho reduzidas, gratificações de toda a ordem às aposentadorias e outras benesses que se penduram – e depois se incorporam – aos salários.
A personagem social que de fato custeia isso tudo, o empreendedor, é tratado no Brasil como um permanente suspeito de estar também renitentemente propenso a uma falcatrua, como se todos fossem Odebrechts, Camargos Correia, Queiroz Galvão em potencial que apenas ainda não foram flagrados.
Pelas exceções estigmatiza-se a pessoa que, além de trabalhar e se dedicar ao seu negócio, contrata crédito, cria empregos, paga impostos e ao apurar um prejuízo não conta com a solidariedade de um Governo voraz no confisco de parte de sua receita com impostos. Não vem dividir o prejuízo com ele. O empresário médio brasileiro normalmente trabalha mais do que o seu colaborador.
Ou seja, já passa da hora de renomear essa relação patrão-trabalhador para trabalhador-empregado e trabalhador-empregador. Mais que um eufemismo, uma reavaliação justa da exata função social de cada agente. O colaborador, que necessita que alguém gere o trabalho que o empregue; e o empreendedor, que necessita de colaboradores para levar à frente seu negócio.
E que tal dar ao “patrão-explorador-capitalista” a opção de trocar com o Governo o lucro que ele obtém pelo imposto que ele recolhe? Mais valia de quem, cara pálida?
A acumulação perpetrada pelos “barões” e “tubarões” que abocanham mais da metade da riqueza nacional é protagonizada por nem 0,5% de uma comunidade produtiva onde 95% são de micro, pequeno e médio porte que geram seus próprios empregos e os outros que ocupam mais da metade da força de trabalho nacional.
Assim, a sociedade brasileira se retalha nos interesses setorizados e perde de vista um objetivo comum e maior de afirmar o senso de justiça acima dos interesses de classe. Um Pacto Social verdadeiro não se reduz a um factoide político, traduz um consenso de sociedade de que todos devem ceder um pouco para que toda a sociedade ganhe. E, claro, quem tem mais – por qualquer métrica – deve contribuir com mais.
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