A vida vivida é pouca, muito pouca, todo mundo diz isso. O recordar é viver, é ou não é?
Amigos leitores, parece combinado. Para onde estão indo os amigos, as amigas, conhecidos e conhecidas?
Minha senhora, apele para as lembranças toda vez que centrar o pensar em alguém vivo ou morto, não faz diferença.
Na verdade, o recordar de uma alma tida como desaparecida por morte, é mais rica e generosa do que a imagem enquanto estava viva. Após a morte, as lembranças, se a pessoa jogava futebol, ou outras pertinências, são maiores e melhores. Sempre.
Então, não acredito na morte, e nem na eternidade.
É que a lembrança coloca no objeto lembrado o significante que surgir, e com uma velocidade imensurável. Curte e se emociona muito mais e melhor que no tempo em que estava viva, oficialmente.
Às vezes, as lembranças vêm disfarçadas. Geralmente, projetada em outras coisas.
Lembro que certa vez falava a Vitor Santos Neves da falta que me fazia o meu pai. Era a única coisa que ao pensar, se estivesse sozinho, me fazia chorar. Vitor, de quem me lembro em detalhes, frequentemente me aconselhava:
Pensa nele.
Dito e feito. Vitor é um dos meus mais importantes e eficazes objetos de lembrança.
Agora mesmo, enquanto batuco essas mal traçadas, lembro dele. Mais do que se ele estivesse vivo. Lembro de sua casa, sua Branquinha, e seus filhos. Vejo, agora, sua casa na Barra do Jucu à beira de um riacho. (E lembro da outra, no elegante morro da Praia do Canto).
Vejo o Brega, artífice de moquecas, e uma alma serena na vida concreta. Posso descrever cada detalhe, neste momento, de seu restaurante batizado por nós com o seu nome.
A dedicada Lindalva, sua mulher, sempre sorria. Lembro de uma obra de arte fabricada pelos dois, a belíssima e artista campeã Neymara Carvalho.
Atravessa meus pensamentos, sem a menor lógica ou associação, como manda a neurologia, a divertida sala de aula C1 de candidatos à medicina, e aparece Paulo Tavares – acho que vive em Aymorés. Lembro exatamente do rosto e da fala mineira.
Além da casa de Zé Carlos, na mesma cidade, onde hospedou o time de futebol de salão do Estadual. Dodora, sua mulher, minha grande amiga, recordo e me emociono.
Aparece a imagem da sua missa de sétimo dia, na igreja da Praia do Suá. Fiquei em pé, junto de Lurdinha e Vitor, cuja sustentação não hei de esquecer.
O jornal “O Diário” surge nas minhas memórias todo santo dia. Daí recordo de Sandrinha, mulher de Rubinho Gomes, silenciosa, quase calada, um amor.
E de Mirinha Leitão, que veio de Minas com sua calça jeans listrada, e seu talento. Aprendeu ali a fazer o excelente jornalismo que faz.
Cláudio Bueno Rocha, o CBR, bem humorado, me deu importantes dicas de texto e jornalismo.
A imagem que surge na teia de minha substância branca cerebral, é ele sentado com as imensas canelas finas sobre uma cadeira.
Marien Calixte aparece, agora, andando para se exercitar na Beira Mar. Criamos a coluna Victor Hugo. Terezinha Calixte, Sheyla Silva, Mariangela, Carmélia, e o pessoal da oficina, passam para alegrar minha mente.
Surge a Helena Resende e seu café da tarde para os meninos e meninas da Juventude Estudantil Católica, a JEC, que se encontravam em sua escadaria.
Vem à mente Toninho e Danuza, Carlos Magno Cardoso, Chico Celso, Jurandyr, Léa, Flavio Lins e Rosa, Carlito Osório, Guilhermina, Silvinha e grande elenco.
A imagem volta para a escadaria que ia dar no Centro de Saúde de Vitória. Daí, minha mente viaja para as aulas teórico-práticas de psiquiatria do mestre Antônio Barcelos.
Queridos leitores, já notaram que o inconsciente formatador das lembranças vivas, estão sempre vivas, não esconde nada que seja seu? Está surgindo, neste instante, a imagem do padre Valdir e da Catedral de Vitória onde íamos diariamente dar uma “comungada”.
Surge, também, a turma da avenida em Jucutuquara, tentando penetrar de graça no Estádio do Rio Branco, fingindo que estava saindo.
Laurinho brigando, sempre estava brigando, mas um amigo fiel. Leomar Barreto, Augusto, Landerico, Bárrigo e Jairinho. E as piadas de Matheus. Ademais, o nosso campo de pelada e a felicidade em um terreno baldio ao lado do Colégio Salesiano, porém capinado.
Volto a sentir minha mente pronta para receber fatos – porque são fatos as recordações – olhando para as nuvens.
Outra lembrança engraçada.
Recordo que guiado pelo gorducho Tadeu, íamos pescar de canoa no meio da Baía, saindo da Praia do Suá. Nunca pegamos nada, mas a gente se divertia.
Ana Maria Meira morava em frente de casa com seus irmãos Maninho e Cezinha, filhos do doutor Meira, um médico respeitado.
Ezinho, Edna, Zé Helder, Alemão, todos Rebouças.Tinha ainda Brebão e Beth Muniz.
Paulinho e Maurinho vêm à mente com a república do pessoal da Emescam: Wagner, Guto, Tampinha, Oseas. Japonês.
O médico Alcides Silva, que foi presidente da Fundação Hospitalar, é a alma mais pura que passeia nas minhas memórias. Não se pode deixar de associar com a de César Mendonça, que governava bem e com força a psiquiatria do Espírito Santo.
Luiz Buaiz, o nome fala por si.
Sinceras escusas às lembranças que foram e vieram rapidinho ou que nem foram e nem vieram. Coisas do incontrolável.
Frequentemente vem à mente as pessoas de Edgar, Erildo, Tinoco e Erli, todos dos Anjos, e suas façanhas.
Caros leitores, ninguém morre, não precisa sofrer.
Dorian Gray, meu cão vira-lata, revela que se acha um ser superior.
Paulo Bonates é médico, psiquiatra, psicanalista, escritor, jornalista e professor da Universidade Federal do Espírito Santo. E derradeiro torcedor do América do Rio.