Coluna Aqui RUBENS PONTES | Meu poema de sábado
Trabalho de Francisco Aurélio Ribeiro, compilado por Walter Aguiar Filho, publicado em 2012, não perdeu atualidade e continua sendo inestimável fonte de consulta para os estudiosos e interessados no desenvolvimento da cultura literária no Espírito Santo.
Assinala o autor (tanto tempo decorrido e confirmado hoje pelo Portal Don Oleari ):
“a criação da Editora da Fundação Ceciliano Abel de Almeida, UFES, em 1978, foi o fato mais marcante da literatura do Espírito Santo, com a publicação de mais de 300 títulos (*), principalmente revelando jovens autores.”
Rubens Pontes: (*)…até a época desse registro.
Ainda segundo o levantamento, a iniciativa possibilitou aos autores capixabas independência dos grandes centros (Rio, São Paulo, Belo Horizonte, Salvador), para publicação de seus trabalhos, entre eles os jovens escritores, quase todos contistas, lançados nos anos 80 pela FCAA, destacando-se Adilson Vilaça, Marcos Tavares, Sebastião Lyrio, Francisco Grijó.
Os mais significativos poetas relacionados foram Roberto Almada, Oscar Gama Filho, Deny Gomes e Miguel Marvilla, numa linha tradicionalista; Valdo Moura, Sérgio Blank, e Paulo R. Sodré, mais inseridos numa estética de contemporaneidade.
(Outros autores como Lacy Ribeiro e José Augusto Carvalho na prosa, Marien Calixte, José Irmo Goring e Luiz Carlos Almeida Lima, na poesia, venceram concursos literários e tiveram suas obras publicadas fora da FCAA.)
O trabalho de Francisco Aurélio Ribeiro mostra-nos mais que a partir de 1992, com a criação da Secretaria de Produção e Difusão Cultural da UFES e da aprovação de projetos pela Lei Rubem Braga, da Prefeitura Municipal de Vitória, novas fontes de recursos impulsionaram a publicação de livros no Espírito Santo. Vinte e dois títulos foram editados, em dois anos, pela SPDC/UFES e 39 títulos de Literatura editados pela Lei Rubem Braga.
Com legítimo orgulho, confirmado pelo Portal Don Oleari, constata-se ter atingido a produção literária do Espírito Santo, neste ano de 2021, destacada posição no ranking como uma das maiores do país, proporcionalmente ao seu tamanho e expressão econômica no contexto nacional.
Reinaldo Santos Neves, Bernadette Lyra, Amylton de Almeida, Valdo Motta, Sérgio Blank, Paulo Sodré, Marien Calixte, são alguns dos autores de nível nacional divulgados pela mídia e conhecidos além fronteira capixaba , alguns deles com trabalhos editados também fora do País.
A Coluna, confirmando o enfoque, selecionou para este sábado poemas do gênero hai kay de Marien Calixte, saudoso companheiro, jornalista, radialista, escritor, poeta, pintor, portador da Comenda Jerônimo Monteiro.
Membro da Academia Espírito-santense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico, Marien mudou de plano em 2013.
Selecionou também um poema de Kátia Bento, nascida e apaixonada por Castelo, sul do ES, hoje morando no Rio de Janeiro sem nunca perder contato com sua cidade, autora admirada por expoentes brasileiros da cultura poética como Manoel de Barros, Paulo Lemniski e Marcos Tavares.
A Coluna deste sábado leva aos seus leitores um poema de Kátia Bento – Primeiro Canto e pequena seleção de hai kais de Marien Calixte.
Rubens Pontes, jornalista
Fonte: A Literatura do Espírito Santo – uma marginalidade periférica,
Francisco Aurélio Ribeiro/1996
Compilação: Walter de Aguiar Filho, /2012
Rubens Pontes
PRIMEIRO CANTO NATIVO
Kátia Bento
No vão aberto invisível
entre dia e madrugada
mora a fração mais criança
da manhã aguardando orvalhos:
fugazes prendas da noite
que ao primeiríssimo açoite
do dia, logo espalham.
No vão das pedras mais lisas
do rio, loca de peixes
gasosas gotas de lua
ficam postas – represadas.
êm nesse espaço encantado
do tempo e desse lugar
porque as mãos qual bateria
catar as gotas, o brilho dessa toca de luar.
Me dá, dá só um pedaço
desse momento encantado
antes que a água doce
caia em sanguínea emboscada.
Me dá, dá só um pedaço
desse momento de graça
antes que passe – veja!
boiando n’água essa folha
deitada na correnteza.
Que eu me desvio inteira
do tempo além dessa fonte:
enquanto o amor é o mesmo
para mim também é instante.
Marien Calixte
LIVRO DE HAIKAIS
Prefácio de Carlos Nejar
São Paulo: Massao Ohno Editor, 1990
O mundo após
faz antigo o sulco
que se extrai agora.
*
Dorme comigo
a palavra
sem temor do sonho.
*
Evapora-se o rastro
na memória.
Já amei este nome.
*
Uma parte de mim
sofre. A outra des-
vencilhou-se.
*
Tropeço e caio
levanto
me distraio.
Rubens Pontes