Uma cidade
Kleber Frizzera
Nas últimas semanas, as principais cidades da região metropolitana de Vitória anunciaram obras que se propõem a fornecer um sentido, produzir uma imagem e identidade singulares às suas eventuais particularidades físicas, sociais e culturais.
Assim, Vila Velha apresentou um letreiro assentado na encosta do Morro do Moreno, “similar” ao instalado em Hollywood, em Los Angeles.
Serra publicou uma imagem de um centro artístico/heliponto no meio da rotatória do O. Cariacica convida para a inauguração da sua própria “orla”, implantada às margens da baía de Vitória.
Mais que evidentes projetos visando as eleições municipais 2024, estas cidades, partes da metrópole, buscam erguer ícones, marcas próprias, que as destaquem, e que possam identificar suas populações, de origens recentes e diversas, principalmente em Vila Velha e na Serra.
A capital, uma cidade vivendo a perda de centralidade econômica, política e social, envelhecimento da população e concentração da renda, sob riscos da reforma tributária e da contração da economia extrativista-petróleo-minério e aço, o que tem para mostrar, uma memória ou um futuro?
Uma cidade
Vivemos atualmente em uma Vitória – quase metrópole – fragmentada, desfeita, urbs e polis, em desconexas partes físicas, em múltiplos recortes sociais e de renda, uma metrópole esfacelada, segregada em condomínios e bairros, cada vez mais dependente do carro para ligar suas partes e lugares.
Esgotado um (im)possível sonho de unidade diante das disputadas identidades, a cidade, que, desde os assentamentos neolíticos à globalização contemporânea, fez de seu centro, coração de uma metrópole, hoje mal se reconhece como um ambiente partilhado, de frente a distorcidos mapas ou canceladas paisagens.
Os esforços municipais estariam condenados a fracassos, incapazes os símbolos, edifícios e letreiros proposto, de instituir um comum, expor e articular os conflitos, quando, livre dos vínculos do passado, recupera-se a política, lugar dos diferentes e iguais?
Roberto Esposito (*) pergunta:
Como pode uma sociedade ser unificada por sua próxima divisão?
(*) Roberto Esposito é um filósofo italiano, especialista em moral e política. Leciona na Escola Normal Superior de Pisa.
Para ele, a imaginação pode instituir esta unificação, e conforme Castoriadis, através de “fazer de um não ser um ser”, pela insurgência pública de uma nova práxis vivida de forma pública.
No equilíbrio entre o ser e o devir, entre a história e natureza, entre a permanência e as transformações, o imaginário assume uma forma política, que realiza a passagem da heteronomia `a uma autonomia, individual e coletiva.
Esta autonomia se instala sobre um sítio, suportada por recursos naturais, culturais e sociais, gerando, no tempo e acontecimento, uma instituição social, “dentro das quais poder e conflito se relacionam”.
Mas, para Esposito, é o temor da perda, diante da falta que a deriva que é o fator constitutivo de uma comunidade, é o medo, que “esta’ na origem da política, … não haveria política sem medo”.
Cidades que almejam, para seus moradores sem raízes, fornecer sentidos por um letreiro, em uma rotatória, levantar um sítio das artes e cultura, ou inventar uma orla onde não há praia, exploram o receio público de não contar com um sentido que ultrapasse a suas posições secundárias na metrópole e que torne suportável o horror da morte.
O fim do centro, do sentido coletivo que transborda e acolhe, é o fim de tudo, de onde recolher as referências e significados, de onde se proteger dos riscos, de onde superar a falta original, o receio da extinção.
Na praia cheia, ensolarada, feriado, jovens casais, mães solteiras, crianças se dissolvem em água e areia, picolés e milho alimentam o gosto, o prazer ocupa o corpo desnudo, risos e cantos envolvem a multidão.
Órfãos de um centro perdido, condenados à incompletude, estamos tentando imaginar, desejar, que nos cacos, nos restos, nas ruinas dos múltiplos desfazimentos, caiba recolher, no convívio e na alegria da vida comum, um brilho, um salto no futuro.
Kleber Frizzera
Novembro 2023
Uma cidade
Edição, Don Oleari – [email protected] –
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