Paulo Caruso, Paulo Caruso
Reproduzido com autorização do autor.
…Às vezes dá preguiça resistir ao escancarado caos presente em todos os governos, em maior ou menor grau…
Se o texto de humor, cifrado por natureza, driblava a censura sempre estúpida, claro, o desenho arrasava. Se alguém fez o mínimo de graça nas intervenções da censura foram os desenhistas e humoristas
O humor me parece a prova mais importante do funcionamento da inteligência humana. A beleza de uma obra de humor nunca está explícita, pelo contrário. A capacidade de capturar a graça, para mim, determina o pré-requisito da saúde mental.
Deveria constar no exame do humor um atestar técnico competente no exercício do pensamento. Pessoas que estejam privadas do exercício completo do funcionamento psicossomático estão, por isso, impossibilitadas de compartir o humor e, portanto, o pensar.
Feliz Natal – diz o galo para o peru.
Vai te ferrar.
Tudo isso é para dar uma notícia triste. Morreu Paulo Caruso, 73 anos, gêmeo univitelino de Chico Caruso, dois gênios.
O humor atravessa com maior ou menor sutileza a comunicação com as pessoas e dá um molho no texto, na imagem, em qualquer modalidade de arte. Compõe também a ironia, geralmente agressiva. E às vezes significa exatamente o contrário do que é comunicado com palavras, mímica, silêncio, cartazes, música….
Uma vez, na intenção de ser solidário, perguntei a um amigo cujo boteco anunciava o que todos já sabiam:
“Encerramos as atividades dia tal.”
Querendo parecer solidário perguntei:
Por que vai fechar?
Excesso de lucratividade, não sacou?
Enfiei minha viola no saco, e os poucos frequentadores naquela data me olharam de lado. Não reconhecer o que é óbvio para todo mundo, não é humor, pura estupidez.
Convivi com alguns talentosos humoristas profissionais, principalmente nos jornais onde trabalhei, vida afora.
Milson Henriques, Amarildo, Genilson, Janc, Frank, e outros, levados para a charge editorial. Meus tolerantes leitores que perdoem os esquecimentos.
No apogeu da besteira nacional, a ditadura de 1964, que invadiu o próprio país, fornecia sistematicamente material para o humor, justo no auge da violência. Meu amigo Luiz Raul Machado e eu, ainda adolescentes, aproveitávamos o ridículo dos ditadores para alimentar o humor.
Um desses chefes da ditadura, em data dessas imposta por eles, teria feito um resumo do golpe de 64:
“Encontramos o país à beira do abismo. Afastamos os corruptos e subversivos e demos um passo em frente”.
Essa fixação é crônica.
A imprensa, mesmo sob covarde pressão, foi o abrigo da resistência e militância pela democracia. Pelo menos a maioria. Já contei aqui e vou contar de novo. Toda santa tarde chegava um carrinho – Fusca ou Gordini – com seus policiais para censurar previamente as matérias que ainda estavam sendo escritas.
Particularmente, eu gostava de entregar para eles muitos folhetos de propaganda que chegavam na redação e similares. Liam tudo.
Então…
No Rio de Janeiro, bem no centro de Ipanema, um grupo de jornalistas foi se organizando até fundar o hebdomadário “O Pasquim”. O jornal semanário foi palco do genial cartunista Paulo Caruso, que nos deixa triste agora.
Se o texto de humor, cifrado por natureza, driblava a censura sempre estúpida, claro, o desenho arrasava.
Se alguém fez o mínimo de graça nas intervenções da censura foram os desenhistas e humoristas: Ziraldo, Zélio, Henfil, Jaguar, Fortuna, Millôr Fernandes, Cláudio Bueno Rocha (que trabalhou por aqui), Luiz Fernando Veríssimo, Ivan Lessa, Miguel Paiva, Nani, Edgar Vasques, Jules Feiffer, Aldir Blanc, Guidacci, Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga e quem mais quisesse e soubesse emprestar o seu talento, na verdade, à resistência pelo humor.
Às vezes dá preguiça resistir ao escancarado caos presente em todos os governos, em maior ou menor grau.
Não se martirize botando culpa no seu voto. Não dão a mínima importância para ele.
Dorian Gray, meu cão vira-lata, não acha graça de nada.
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“Só o Humor Salva!” (Don Oleari).
Paulo Caruso
Paulo Caruso