Kleber Frizzera: Incompletude. Quase metrópole | 24/11

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Incompletude

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Observe. Este é o instante em que se ouve o coração do mundo. Este é o instante em que o vento sopra, invadindo a cidade em seus quatro pontos cardeais. Observe. Este é o instante em que Vitória se parece com qualquer cidade do mundo, apresentando-se anônima para sempre (Amylton de Almeida).

Talvez, por causalidades e/ou determinantes históricos, geográficos e econômicos, que modelaram o território e sua população, limitaram seu passado e reduziram os sonhos futuros, o estado do Espírito Santo tem um perfil cultural atrasado, conservador, preconceituoso, uma economia concentradora de renda e um caráter fortemente endógeno.

Seus melhores quadros jovens migram para os centros maiores, nacionais ou internacionais, mais cosmopolitas e diversos, onde buscam acesso a novos contatos, conhecimentos e oportunidades de crescimento profissional e inserção pessoal.

Sobram e mantém-se nas nossas cidades, os desencantados, os desiludidos, incapazes de acumular os esforços, saberes e inovações suficientes para superar a inércia do passado, a longa história de colonização e sofrimento e apontar alternativas para o seu futuro.

Projetos progressistas, desde a república velha, não foram capazes de imantar a sociedade e implantar ações radicais de transformação política e econômica, estimular mudanças sociais, embora o discurso oficial continue a vangloriar o mundo local e valorizar as suas estreitas imitações.

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A cidade, quase metrópole Vitória, produto periférico de projetos eurocêntricos, submetida sua história aos poderes exógenos, brasileiros e internacionais, explodiu fragmentada nas suas dimensões populacionais e espaciais, sem se afirmar como uma cidade completa,manifestação espacial que desestabiliza e busca superar as formas antigas, abrigando os desejos utópicos de sua superação.

Os seus inúmeros esforços de modernização fracassaram, modelos importados, diante do sucessivo, arraigado e contínuo provincianismo cultural e da negação conservadora de sua elite, incapaz de superar as suas limitações ideológicas, profissionais e sociais.

Encerradas as disputas eleitorais, podemos pensar, imaginar outros sonhos, propor outros projetos e outras potencialidades?

Nenhum dos programas apresentados para o cargo de governador, apresentou propostas consistentes para problemas atuais e futuros da metrópole: habitação social, transporte coletivo, redução das desigualdades no acesso aos bens e serviços públicos, e alternativas econômicas para as próximas décadas, que superem à dependência das exportações de comodities e da acumulação rentista financeira.

Dias claros, domingos ensolarados, praias cheias, prazeres noturnos, não conseguem esconder as desigualdades ou simular uma sociedade igualitária, desnuda de preconceitos e ódios seculares, e o consumo natalino, luzes e brilhos, apenas escamoteia as infinitas diferenças na aquisição de bens, na apropriação de serviços, acessados pelas desiguais classes sociais.

Quais as condições para superar as faltas e ausências em uma cidade incompleta?

Não há soluções adquiridas em catálogo ou manuais, cada cidade é única, e ao mesmo tempo, todas as cidades são como Vitória. Ao observar outras metrópoles podemos reconhecer seus sucessos e fracassos, acompanhar feitos e movimentos inovadores, reconhecer alguns caminhos já acertados.

Algumas indicações podem nos ajudar a reconhecer iniciativas, associar saberes tradicionais e acadêmicos, práticas populares e artes eruditas, experiências corporais e abstrações singulares.

Enumeremos algumas ideias, sugestões:

Multiplicar e facilitar os deslocamentos públicos de bens e pessoas, propiciando a expansão de encontros pessoais e do acesso às informações virtuais, ambos espaços de reunião, simultaneidade.

Estimular a juventude, educação e entretimento de qualidade, encantar lugares e prover infraestruturas, inventar novas ordens de produção, distribuição e consumo, na ótica da natureza, da cultura e da arte, que semeiem as novas “relações sociais e novas formas de cooperação”.

Romper as segregações, os isolamentos físicos e as restrições simbólicas, vazar identidades e sonhos, revelar memórias, desperdiçados projetos, lembranças felizes, mas também não deixar esquecer sofrimentos e apagamentos, preconceitos e ilusões, e do cotidiano trabalho, formar consciências.

Inventar uma economia que preserve o mundo natural, ar e terra, paisagens e artifícios históricos, culturais e artísticos, uma economia do compartilhamento da riqueza produzida em comum e de um ambiente saudável e belo, vivido entre iguais e diferentes, entre os próximos e os distantes, “nos instantes em que se ouve o coração do mundo.”

Kleber Frizzera

Graduado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal de Minas Gerais (1971) e mestrado em Arquitetura pela Ufes Universidade Federal do ES (1998). Foi secretário municipal de desenvolvimento da Prefeitura de Vitória/ES (2006/2012) e professor adjunto da Universidade Federal do Espírito Santo ( 1978/2015) – https://www.ufes.br/. Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase em Fundamentos de Arquitetura e Urbanismo, atuando principalmente em projetos de arquitetura, arquitetura teoria e crítica, arquitetura áreas centrais, planejamento territorial e renovação urbana.

Novembro 2022

 

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Don Oleari - Editor Chefão

Radialista, Jornalista, Publicitário.
Don Oleari Corporeitcham