Inteligência
As coisas.
Que tristes as coisas, consideradas sem ênfase. (Carlos Drummond de Andrade)
A Inteligência, a consciência e a imaginação que sempre reconhecemos como atributos exclusivos da humanidade, estão sendo capturados pela inteligência artificial, rapidamente ocupando a internet, e tornadas competidoras de nossas particulares competências. Notícias especulam dos números e das diversidades de empregos que serão destruídos, dos riscos do surgimento de uma entidade artificial incontrolável e dos poderes concentrados nas empresas que organizam estes aplicativos tornados “vivos e autônomos”.
O que eram apenas narrativas de ficção cientifica, desde Hal, o computador do filme 2001, Uma odisseia no espaço, que coloca em risco as vidas dos astronautas, e tantas outras séries e livros que descrevem estes fatos no futuro remoto, torna-se um problema atual e crescente.
No desejo insano de ampliar seus lucros, as empresas de tecnologia, se livrando de qualquer limitação ética ou social, entregam ao consumo e à experimentação aplicativos de IA, que reconhecem, não detêm sistemas de segurança suficientes para uma aplicação imediata.
Do mesmo modo, segundo Jonathan Crary, “Os danos que são infligidos ao olhar, ao rosto e à voz pela imersão perpétua em ambientes on-line, …nossa subordinação compulsória e passiva às redes sociais, …também leva ao empobrecimento e à corrosão da experiência individual e compartilhada.
Um proposto mundo virtual, um metaverso, feito de experiências imateriais, continua Crary, “desfigura inexoravelmente nossa percepção e as capacidades sensoriais necessárias para que conheçamos e nos liguemos afetivamente a outras pessoas”.
Desaparecidos os símbolos cotidianos, ancorados na vida em comum, abandonada a percepção corporal, opta-se por uma atenção rasa, que não produz relações e não estabiliza um mundo banal. A atenção virtual, sem as restrições da rigidez e opacidade da matéria, acelera o tempo, saltando as passagens e os limites, onde os rituais investiam nas celebrações das festas, da memória em comum e de suas inscrições concretas.
Mas como iremos nos comportar diante destes novos instrumentos tecnológicos?
Serão parceiros de nossos trabalhos, aumentando nossas capacidades de pesquisa de dados e de criação intelectual, ou feitos inimigos, concorrentes, nos tornarão obsoletos, corpos e espíritos, de limitados conhecimentos e práticas, capacidades e sonhos?
Seremos condenados e reduzidos, no futuro, a meros espectadores, seres incapazes à altura destes elaborados algoritmos, que vasculham e se apropriam da riqueza da produção e criatividade humana, acumuladas nas nuvens virtuais?
Aos riscos crescentes do futuro do planeta e da humanidade, ameaçados pelas mudanças climáticas, guerras e desigualdades sociais, soma-se a redução à inutilidade de parte da população, desnecessária para a maior parte dos encargos profissionais, substituídas pela acelerada expansão dos robôs, da experiência virtual e inteligência artificial.
Inúteis ao sistema capitalista, tornados precários, homens e mulheres serão reduzidos a serviçais dos gostos gourmet, abandonando o restante, migrantes, pobres e miseráveis, às suas próprias sortes, em países e regiões do terceiro mundo.
A violência virtual se agrega à que nos é imposta no cotidiano, das falsas notícias, dos preconceitos, perdas e apagamentos, e “os risos da vida que passa lesam-me como luzes de fósforos riscados no rugoso sensível do meu coração”, escreveu Fernando Pessoa.
Kleber Frizzera – Abril 2023
Economia do Mar: Espírito Santo busca referências da Noruega | 15/4