Todas as cidades são Veneza
ARTIGO |
Kleber Frizzera
O céu estará límpido
As ruas abrir-se-ão
Sobre colinas de pinheiro e pedra.
Serás tu – imóvel e clara (Cesare Pavese)
Marco Polo, diante de Kublai Kan, que se orgulha das múltiplas e inumeráveis cidades de seu império, afirma e recorda que todas são como Veneza, a sua cidade natal.
Lugares armados para o comércio e produção de coisas, bens, palavras, de trocas de informações e lembranças, postos avançados das civilizações, de seus poderes e culturas, sejam pequenas vilas ou imensas metrópoles compartilham de um único desejo, uma comum vontade, demarcados no sitio natural.
De cortes retos, ou de estreitos trilhos, com desenhadas marcas ortogonais e vazios interiores, feitos em curvas que se acomodam em terrenos elevados, ou retas infinitas nos planos planaltos, dominando, fortes e palácios, as paisagens e antecipando os riscos de invasões, se estendem em vales, a beira de rios ou de mar, em afastados desertos, o que terão em comum?
Nas cidades, entre a multidão, vislumbro a passante que me recorda hoje os olhos, a dobra do busto, o feitio dos quadris e das pernas, o cheiro de louro e os cabelos negros desenvoltos.
Nas cidades, algo me empresta os diferentes, suas cores, línguas, disposições, me oferece o mundo distante e a longa estrada, me assusta e me encanta, me afasta e me aproxima, de suas histórias impressas em seus corpos e gostos outros.
Nas cidades, as vitrines recortam os suaves gestos e feitos objetos, joias, roupas, doces e pães que exalam prazeres guardados de manhãs esplendorosas e de tristes solidões, quando a chuva escorre nos vidros das janelas o cinza do dia.
Nas cidades, as multidões, em festas, carnavais e procissões, desdobram fantasias e sonhos, elevam músicas aos céus, aguardam benfeitorias, graças e pequenos milagres, mas também em comício, exalam proporções e altos gritos de revoltas e de paixões comuns.
Nas cidades, se faz o presente, se imagina o passado e se propõe os futuros, imaginações intermediam falas sujeitas e racionais explicações, desdobram possíveis e impossíveis soluções, afiançam compromissos gravados em terras, pedras e nuvens.
Pequenos gestos, de cotidianos e repetidos afazeres entornam a continuidade das vidas humanas, em longas ruas e ensolaradas praças e jardins, recriam passados paraísos perdidos, oferecem lembranças esgotadas.
Inúmeros becos e escadarias anunciam passagens sombreadas, o sol em raios fúlgidos reflete em branco nas altas janelas e cunhais, ruas ascendem em curvas aos morros e se esparramam em vales em destino ao rio Tejo.
Ou será a baía de Vitoria?
Quando cruzamos um olhar ao oferecer o comprimento do dia, desvia da visada o caminhante, recorda-se de dores antigas, de escravidão e trabalho, de longas viagens de imigração e sofrimento.
Todas as cidades são Lisboa,
Todas as cidades são Vitória.
Kleber Frizzera
Lisboa, fevereiro 2024
(*) Kleber Frizzera | Graduado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal de Minas Gerais (1971). Mestrado em Arquitetura pela Ufes (Universidade Federal do ES) em 1998.
Foi secretário municipal de Desenvolvimento da Prefeitura de Vitória/ES (2006/2012). Professor adjunto da Universidade Federal do Espírito Santo ( 1978/2015) – https://www.ufes.br/.
Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, com ênfase em Fundamentos de Arquitetura e Urbanismo, atuando principalmente em projetos de arquitetura, arquitetura teoria e crítica, arquitetura áreas centrais, planejamento territorial e renovação urbana.
Todas as cidades são Veneza
Edição, Don Oleari – [email protected] –
https://www.facebook.com/oswaldo.oleariouoleare – https://twitter.com/donoleari
Anilson Ferreira | Rio Branco perde pro Vila Nova de Goiás pela Copa Verde
CRJs recebem equipamentos multimídia para uso nos Laboratórios de Potencialidade
“Direita do Espírito Santo está unida”, diz o polêmico Pastor Fabiano